Instituições da sociedade civil se reúnem em rede pelo direito à educação na vida adulta
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Aliança reúne 16 instituições e busca atuar pelo fortalecimento das políticas públicas para a educação de jovens, adultos e idosos

O Brasil tem mais de 66 milhões de pessoas com 15 anos ou mais que não concluíram a educação básica e estão fora da escola — entre elas, 8,9 milhões de jovens com até 29 anos. O desafio de enfrentar essa exclusão educacional, que atinge mais de um quarto da população, motivou a criação de uma rede dedicada a defender o direito à educação de jovens, adultos e idosos. Formado há um ano, o grupo realizou seu último encontro de 2025 na sexta-feira, 28, no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro.
A aliança reúne 16 instituições com longa trajetória no campo educacional, mas com perfis diversos: Ação Educativa, Fundação Arymax, Ashoka, Conhecimento Social – Estratégia e Gestão, Fundação Bradesco, Fundação Itaú – Itaú Educação e Trabalho, GIFE – Grupo de Instituições, Fundações e Empresas, Instituto Rodrigo Mendes, Pacto Global, Redes da Maré, Sesi Nacional, Todos Pela Educação, Unesco, Unicef, United Way Brasil e Fundação Roberto Marinho.
“Por muitos anos, a educação de jovens e adultos foi tratada como um tema secundário no Brasil. Parecia que, se a pessoa não tivesse estudado na idade certa, não havia mais o que fazer. A rede nasce justamente para romper esse imaginário e afirmar que todos têm o direito e a possibilidade real de retomar seus estudos”, conta Ana Lima, cofundadora da Rede Conhecimento Social.
Ela destaca que uma das grandes forças da rede é o coletivo. “Organizações que já atuavam isoladamente começaram a perceber que, juntas, poderiam fazer mais e melhor. Trabalhar em rede não só soma forças, como também protege a agenda e permite que o tema ganhe voz coletiva, sem depender do protagonismo de uma única instituição”, avalia.
Coordenador da Ação Educativa e especialista na temática, Roberto Catelli defende que a falta de conhecimento público sobre a EJA é um retrato da marginalidade sofrida pela modalidade. “Essa dificuldade de comunicação reflete a marginalização histórica da EJA nas políticas educacionais. Muitas vezes, não há chamadas públicas, informações claras ou interesse real em divulgar a modalidade, o que faz com que boa parte da população nem saiba que ela existe. Sem visibilidade, a EJA permanece tratada como a ‘prima pobre’ da escola, como um espaço para quem ‘não deu certo’, quando, na verdade, deveria ser reconhecida como um direito de todos os adultos”, afirma o pesquisador.
A superintendente de Conhecimento da Fundação Roberto Marinho, Rosalina Soares, ressalta que 38% dos brasileiros ainda vivem sem acessar um direito fundamental garantido pela Constituição: a conclusão da educação básica. “Enfrentar essa realidade exige coordenação, coragem e a atuação conjunta de diferentes setores da sociedade. Quando asseguramos esse direito, não transformamos apenas trajetórias individuais, transformamos o país. A Rede nasce para sustentar essa mobilização coletiva, que pretendemos aprofundar em 2026”, afirma.
Segundo Rosalina, o VI Encontro também foi um momento de balanço e planejamento. “Pudemos revisar nosso primeiro ano de atuação e projetar os próximos passos, com foco na produção e disseminação de conhecimento, na incidência em políticas públicas e na comunicação e mobilização social, sempre orientados pela inclusão, permanência e conclusão da educação básica por jovens, adultos e idosos”, completa.
No encontro, o grupo fez uma recapitulação das ações desenvolvidas ao longo do ano, revisitou o status atual do Plano Nacional de Educação (PNE) e conheceu a proposta de governança que orientará os próximos passos da rede. A agenda também incluiu um momento de planejamento coletivo para 2026, com foco na definição de prioridades e na organização das frentes de trabalho.
O debate sobre EJA no PNE
Um dos focos de debate da rede foi o novo Plano Nacional de Educação (PNE) para o decênio 2025-2035, que tramita neste momento na Câmara dos Deputados. Trata-se de um dos instrumentos normativos mais importantes para a educação no Brasil, que estabelece as diretrizes, objetivos e metas que vão orientam a construção das políticas públicas e estratégias educacionais.

Paloma Lima, coordenadora de Monitoramento e Avaliação da Fundação Itaú - Itaú Educação e Trabalho, explica que, historicamente, a EJA aparece de forma secundária no PNE, com objetivos e metas pouco alinhados às especificidades da modalidade e à diversidade de perfil do público atendido. Por isso, o momento de renovação do PNE foi compreendido pela rede como uma janela importante de oportunidade para tentar trazer a EJA para o debate.
“Quando olhamos para o novo PNE, vemos avanços importantes para a EJA. Pela primeira vez, o plano inclui um objetivo específico para a educação de jovens e adultos — algo que nunca tinha sido contemplado nas versões anteriores e que representa um marco simbólico. Além disso, o fato de o PNE trazer metas mais concretas é um ganho significativo. Até então, trabalhávamos com metas muito genéricas, que pouco diziam sobre o que o país realmente precisava entregar. Agora, com indicadores mais definidos, temos uma base mais sólida para cobrar resultados e fortalecer a modalidade”, explica Paloma.
De acordo com Paloma, no processo de debate do PNE a rede preparou um documento mais robusto, com informações por faixa etária e sugestões de alterações no texto dos objetivos. “Era muito importante a alteração de alguns textos, até mesmo a redação do próprio objetivo da EJA. A gente nota que algumas [sugestões da rede] se transformaram em estratégias. É o caso da formação continuada de professores, da cobertura de oferta nos municípios, da busca ativa... Tudo isso entrou como estratégias, algo muito importante para o plano nacional de educação”.
A previsão é que o novo PNE seja votado em dezembro na Câmara dos Deputados e, após votação, siga para a apreciação do Senado Federal.
