Artigo: A Democracia é boa para cuidar do nosso dinheiro?

A Democracia é boa para cuidar do nosso dinheiro?

Orçamento Público e Democracia

O processo de elaboração e aprovação do Orçamento Público sempre gera questionamentos e tensões, mesmo quando não existia o tal do “Orçamento Secreto” aprovado pelo Congresso Nacional para 2022, com R$ 16,5 bilhões distribuídos para deputados e senadores por meio das emendas de relator sem sabermos para qual fim.

Infelizmente esse momento-chave do planejamento público faz lembrar a célebre pergunta gritada aos risos pelo apresentador Silvio Santos, no seu programa dominical: “Quem quer dinheiro?!!” (menores de 50, favor escavar na internet).

A definição sobre o uso e a distribuição dos recursos públicos é uma das atribuições mais difíceis das democracias. Como entrar em acordo, ou mesmo satisfazer uma ampla maioria, em sociedades cada vez mais fragmentadas e desiguais, ao mesmo tempo em que recursos (financeiros e naturais) se mostram insuficientes e escassos?

A boa notícia é que investir em participação cidadã e transparência, componentes centrais da gestão democrática, é um bom negócio, não só para gastar melhor os recursos públicos, como também para arrecadar mais! Citado por Ronaldo Lemos em seu blog Como arrecadar mais impostos?, um estudo do Banco Mundial aponta que, quanto maior a participação pública no governo (como conselhos e orçamento participativo, por exemplo), maior será a arrecadação de impostos.

Orçamento em tempos de crise: Chama o Cidadão!

A busca por formas mais transparentes e justas de alocar recursos públicos levou à invenção, em 1989, na Prefeitura de Porto Alegre, do Orçamento Participativo (OP): uma inovação democrática entre as mais copiadas e admiradas no mundo.

Seu princípio básico é simples: a própria população tem mais capacidade e legitimidade para decidir sobre o uso do dinheiro público. Sua aplicação, porém, envolve várias etapas: divisão por regiões, recebimento das propostas cidadãs, diversas assembleias para discussão das propostas e, finalmente, a votação popular.

As professoras Carla Bezerra e Gabriela de Brelàz, durante o excelente Simpósio sobre Processos Deliberativos na Alocação Orçamentária realizado nos últimos dias 4 e 5 de Abril, deram algumas explicações para a perda de relevância dos OPs na gestão pública brasileira, após o ápice de adoção por 104 municípios em 2004. Para além da resistência de outros partidos, por ser uma “marca” associada ao Partido dos Trabalhadores (PT), teríamos, de um lado, o aumento nas restrições dos orçamentos municipais (dependência de verbas federais, muitas “carimbadas”, Lei de Responsabilidade Fiscal...) e, de outro, o “clientelismo orçamentário” e a lógica de “balcão”, que prevaleceria quando as propostas de orçamento chegam às casas legislativas.

Vários municípios brasileiros (e muitos no exterior também) continuam adotando o Orçamento Participativo, com diversas adaptações e nomes. E nos últimos anos, conforme discutido nesse Simpósio, surgem experiências bem sucedidas de “Orçamentos Deliberativos”: um grupo de moradores sorteados por toda a cidade é convidado e apoiado, com tempo e estrutura, para se reunir, se informar sobre as necessidades e propostas em cada região, deliberar, chegar em acordos (ao invés de votarem) e fazer recomendações cidadãs sobre investimento e despesas no município.

Aqui no Brasil já temos a experiência dos Minipúblicos, de São Miguel Paulista e Pirituba-Jaraguá, no âmbito do projeto (Re)age-SP, para demonstrar que cidadãs e cidadãos são excelentes para alocar bem o dinheiro público, de forma responsável, dentro dos limites existentes e, muito importante, com foco no bem coletivo.

Parodiando Chico Buarque:

Acorda gestor
Que o bicho (orçamento) é brabo e não sossega
Se você corre o bicho pega
Se fica não sei não
Atenção
...
Clame, chame lá, clame, chame
Chame o cidadão, chame o cidadão, chame o cidadão!

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