Um futuro sustentável por meio da cultura
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As áreas compreendidas no âmbito da economia da cultura e das indústrias criativas no Brasil geraram, em 2020, mais de R$ 230 bilhões de reais, valor que supera a participação do setor automotivo no PIB nacional, com ao menos 1,4 milhão de pessoas formalmente empregadas no país, de acordo com dados do Observatório Itaú Cultural.
Sendo o setor que mais emprega jovens entre 15 e 30 anos no mundo, não é retórica a afirmação de que a cultura gera inclusão social e produtiva, com uma contribuição média ao PIB dos países da ordem de 3,1% e respondendo por aproximadamente 6,2% dos empregos. Entretanto, esse dado é impreciso quanto às disparidades e assimetrias do contexto mundial. Países como os Estados Unidos têm uma contribuição da economia criativa que alcança 4,4% do PIB, representando mais de um trilhão de dólares. Outras regiões não convivem com essa pujança.
Contudo, essas desigualdades não estão presentes apenas entre os países, mas também na esfera doméstica de algumas nações onde o acesso e o direito à participação na vida cultural não é uma realidade para parcela significativa da sociedade. Na Ibero-América, por exemplo, a média da população que visitou um museu durante o ano não superou os 27%, de acordo com o último relatório temático da Organização de Estados Ibero-americanos (OEI). A taxa de assistência a obras de teatro e a cinemas também mostrou números tímidos, evidenciando a necessidade de mecanismos que garantam o acesso e a democratização da cultura, desenvolvendo atividades que valorizem a diversidade cultural, em estreito diálogo com os territórios.
Quando falamos do legado que queremos construir para o nosso futuro, a cultura reforça mais uma vez a sua pertinência como elemento estratégico para uma sociedade que demanda a formação de cidadãos capazes de superar problemas complexos em um cenário de profundas incertezas. A cultura, em suas diversas manifestações, oferece ferramentas valiosas para aprimorar o pensamento crítico, a criatividade, a colaboração e a comunicação intercultural, habilidades essenciais para navegar pelos desafios contemporâneos.
Nos parece, contudo, que vivemos um momento oportuno para reforçar os consensos sobre a cultura, seu impacto e suas conexões. Inúmeros informes têm destacado a importância de integrar as artes e o patrimônio cultural nos currículos de educação formal, vislumbrando as escolas como centros culturais. Da mesma forma, é também reconhecido o papel de instituições culturais como espaços educativos, em que o Museu de Arte do Rio (MAR) é mencionado como referência na ação coordenada entre cultura e educação.
Parte desse mesmo panorama, a contribuição da cultura ao desenvolvimento sustentável ganhou um reforço com a declaração da MONDIACULT 2022, Conferência Mundial da UNESCO sobre Políticas Culturais, que realçou a necessidade de tratar a cultura como um bem público mundial, defendendo seu reconhecimento específico entre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Afinal, embora tenha contribuições transversais, sempre me pareceu equivocada a defesa de que a cultura já estaria contemplada no âmbito da Agenda 2030, como uma retórica que parece mais uma declaração de consolação.
Entretanto, aproveitando o momento em que os países parecem convergir para o reconhecimento específico e nominal da cultura para o desenvolvimento sustentável, nesse ano que precede a MONDIACULT em Barcelona, é ainda mais urgente avançar nos debates e na necessária articulação entre governos, ONGs, iniciativa privada e organismos internacionais, envolvendo ativamente a cidadania, para a efetivação da cultura como um direito fundamental em sua plenitude.
* Raphael Callou é Diretor-Geral de Cultura da Organização de Estados Ibero-americanos (OEI)